(clique nas imagens para ampliar)
No início da minha expedição ao Manaslu nos Himalaias do Nepal em final de Agosto 2007, voámos num helicóptero de carga russo de Pokhara para a aldeia de Sama (3600m), a um dia de marcha do acampamento base.
Depois de descarregada a carga e a bagagem que foi transportada por carregadores para uma estalagem na aldeia, atravessei o ribeiro defronte do local de aterragem e segui um carreiro.
Cheguei a um chafariz onde se juntavam um grupo de crianças a lavar os dentes!
Tinham sido enviadas pelos professores e estavam muito divertidas cumprindo essa tarefa.
Adoraram ser fotografados, e depois conduziram-me à escola.
Eram uns quinze, um grupo muito animado, que me levaram à sala onde guardavam as escovas no rés do chão. Os professores, um homem e uma mulher jovens, não pareciam achar muita graça à expansividade dos garotos, e mantinham-se contidos, provavelmente devido à presença do estrangeiro.
Cada aluno tinha um prego espetado na parede com o seu nome onde pendurava a escova de dentes.
Percebi que eles residiam na escola pois as famílias morariam a horas de distância a pé.
Foi muito divertido!
PS: Visite o site Rotas do Vento onde encontrará programas de trekking nos Himalaias do Nepal.
Wednesday, December 12, 2007
Thursday, May 31, 2007
Viajando com os Tuaregues no Sahara, Líbia
Os qasr, celeiros fortifcados
Na estrada de Tripoli para sudoeste, a caminho de Gadamés, passamos por dois celeiros fortificados muito interessantes.
Qasr Al Haj, o maior celeiro da Líbia, data do séc XII, e é um belo exemplo de arquitectura berbere, de planta circular. Servia para conservar e para proteger as reservas de alimentos da população da aldeia contígua. Cada família possuía uma dispensa onde armazenava o azeite, em ânforas, e o cereal em células balizadas por madeiras.
Deambulei pelas ruínas da aldeia em redor onde muitas habitações ainda possuem cobertura.
O qasr tem 114 despensas com portas de madeira de tamareira, quatro pisos, onde se guardavam principalmente azeite em ânforas, trigo e cevada. Deixou de ser usado em 2000.
Na entrada tem uma exposição muito interessante de utensílios antigos utilizados em casa e na cozinha, no trabalho agrícola e na guerra ou na caça.
A gestão do celeiro era realizada por um “secretário” que era a única pessoa autorizada a entrar no celeiro e a manusear os víveres.
O celeiro de Nalut, mais adiante na estrada, situa-se num alto à beira de um promontório e está circundado pelas ruínas da antiga aldeia.
Esta região foi muito rica na produção de azeite e por isso possui dois lagares no centro da aldeia antiga, um dos quais activo até ao final do séc XX e quase intacto. A aldeia antiga está em ruínas, mas as suas três pequenas mesquitas estão conservadas. A mais antiga, reconstruída no séc XIV, tem curiosas inscrições em alto relevo nas paredes e nos tectos. Uma delas, um pé descalço, adverte os fiéis de que têm de entrar descalços.
O celeiro fortificado tem uma inscrição que indica ter sido reconstruído no séc XIII. Tem uma planta irregular próximo do quadrangular, e o interior das muralhas de adobe e de pedra parece um bairro habitacional onde se circula em vielas muito estreitas subindo e descendo.
Possui 400 despensas, cada uma com reservatórios para cereal e grandes ânforas para azeite. Para subir-se aos celeiros dos níveis superiores estão cravadas no adobe pedaços de rocha protuberantes que servem de degraus. No topo dos edifícios sobressaem cotos de madeira de tamareira onde se pendurava uma roldana e de que se içavam as cargas.
Ghadamés
Junto à fronteira com a Argélia e a Tunísia, situa-se Ghadamés. Foi desde sempre um oásis de importância estratégica na rota das grandes caravanas de dromedários que atravessavam o deserto provindas do Niger e do Mali e que se dirigiam para a costa. Foi durante séculos uma das mais importantes cidades caravaneiras de todo o Sahara aonde chegavam, vindos do sul, escravos, metais preciosos, marfim, sal, tecidos, especiarias, perfumes, etc.
Os romanos e os bizantinos que a dominaram já entendiam a importância da sua situação. A cidade antiga é um assombro de encanto e de surpresa: parece uma cidade subterrânea, mas não é! Estima-se que foi fundada no séc XIII por tribos berberes. Está envolta em muralhas, e as habitações de dois pisos encontram-se amalgamadas umas às outras ao longo de um labirinto de vielas cobertas onde se caminha longamente na penumbra.
O ambiente é enigmático e insólito, e ao mesmo tempo belo por que se evolui ao longo de diversos tons de sombra desde a quase-escuridão à claridade.
A cidade divide-se em dois bairros habitados cada qual por uma tribo, estas dando origem a sete grandes famílias. Por isso há sete vielas principais e o mesmo número de portões de entrada na cidade, mesquitas, escolas e de pracetas.
A arquitectura desta cidade está concebida para se suportar os quase 50ºC no verão: construção em adobe, poços de ventilação, pequenas aberturas para o exterior nos tectos.
Perto de cada mesquita as vielas abrem-se numa pequena praceta, um local de encontro com bancadas largas. Ainda hoje os anciãos vestidos de jelabas e de óculos com vidros espessos aí se sentam esperando pela companhia de alguém conhecido.
A cidade foi mandada evacuar pelo Estado que quis impor a modernidade e construíu outra ao lado. Infelizmente as novas casas não estão adaptadas aos rigores do verão! Todos os antigos moradores mantêm a propriedade das suas casas e muitos estão a restaurá-las visando um futuro benefício no âmbito do turismo pois a cidade está classificada como Património Mundial pela Unesco. Visitei casas em estado de abandono e apreciei as decorações antigas nas paredes, e subi aos terraços.
Todas as habitações têm um terraço pois a luz é recebida por uma abertura na cobertura.
O terraço é um espaço reservado à mulher, é o seu espaço de convívio com a vizinhas pois não pode saír à rua ou ter contacto com homens que não são familiares.
O guia mostrou-me como um homem e uma mulher batem à porta de uma casa de forma diferente para se fazerem anunciar. Se um homem batesse à porta e ela estivesse só, não poderia abri-la.
Também me mostrou as decorações nas portas de famílias que tinham viajado para Meca para cumprir as suas obrigações religiosas: inúmeros pequenos pedaços de pano verdes e vermelhos pregados à porta.
Dentro das muralhas ainda há espaço para hortas, capoeiras e pequenos currais de cabras protegidos do sol implacável pela sombra de conjuntos de tamareiras.
Frente à entrada principal da cidade está uma grande piscina de água transparente que provém de nascente e que é canalizada para todo o burgo por canais subterrâneos.
Junto de cada mesquita passa um canal e existem recintos destinados às abluções antes da reza.
Os lagos Ubari
Surpreendentemente, as estradas na Líbia têm um bom piso e permitem velocidades “elevadas”. Percorremos os cerca de 1000 km de Gadamés a Ubari, passando por Sebha, em perto de 8h.
Os lagos Ubari situam-se no meio do areal imenso e estão envolvidos por grandes dunas. Antigamente eram uns dez, e hoje resistem três. Ao contrário do que se possa imaginar, o deserto interior da Líbia possui reservas subterrâneas de água doce em quantidades imensas. São reservas acumuladas ao longo de milhões de anos e cujos lençóis estão a poucos metros da superfície.
Não há dúvida de que os oásis na região são muito férteis e verdejantes: observei muitas hortas no meio dos palmeirais e largos campos de trigo.
Os lagos Ubari eram habitados por um povo sedentário que viveu em grande pobreza e subdesenvolvimento por ter escassas fontes de alimento. No lagos pescava uma artémia, um marisco do tamanho de uma pulga de praia, que era a base da sua alimentação.
Há vinte anos, os lagos começaram a conter mais sal do que o suportável e estes habitantes tiveram de ser realojados.
A visão dos lagos no meio das areias é insólita. O mais longo tem cerca de 500m de comprido, e estão marginados de vegetação.
Restam ruínas de habitações, bancadas de secagem dos crustáceos, algum poço tapado de areia, uma mesquita e tufos dispersos de tamarindos e de tamareiras, estas com metade do tronco mergulhado na areia.
O maciço de Maghidet
Para uma caminhada no deserto, procurava uma região pouco frequentada e tranquila. A Líbia ainda não tem muito turismo, mas todos os viajantes utilizam um jeep e vão querer cruzar as dunas, por que é excitante. O incrível é que estes trilhos demoram meses a desaparecer e isso reduz a sensação de isolamento. Um trilho que observo hoje parece ter sido sulcado horas atrás, mas provavelmente foi-o há semanas ou há meses, se não tiver havido grandes vendavais!
Assim, seleccionei o maciço de Maguidet, pouco conhecido entre os operadores de viagens. Situa-se a sul de Ghat sobre a fronteira com a Argélia, no sudoeste do País.
Para realizarmos a caminhada precisávamos de dromedários. Assim trilhámos uma região onde nos tinham dito que os pastos eram bons e onde permaneciam algumas famílias de nómadas.
Na realidade tinha bastante vegetação de giestas e de outros arbustos rasteiros. Mas, os nómadas não se encontravam perto dos animais e isso obrigou-nos a pesquisar vários quilómetros em redor.
Curiosamente, o nosso motorista, o Mansoor, encontrou o seu dromedário fêmea favorito que acariciou longamente com emoção e a quem ofereceu pão duro! Ele tinha confiado os seus animais a uma das famílias, sua parente.
Os primeiros nómadas que descobrimos não estavam disponíveis para nos guiar. Estávamos em Fevereiro e os dromedários tinham crias acabadas de nascer que mal se aguentavam nas patas, e eles não queriam abandoná-las.
Finalmente conhecemos um nómada que se dispôs a acompanhar-nos com dois dromedários, e marcámos encontro para o dia seguinte à tarde. Ele ainda teria de percorrer várias horas a pé até ao local onde queríamos iniciar a caminhada.
O itinerário atravessa zonas rochosas com vales brandos cobertos de areia e de estepe, pequenas dunas com áreas de terra e inúmeros tufos de gramíneas, de giesta e de raros tamarindos raquíticos que resistem solitários.
Notam-se os vestígios da água no centro destes vales pela diferença de coloração e pela vegetação mais densa. Em Janeiro caem chuvas torrenciais que formam verdadeiras torrentes no deserto e isso está marcado nas longas lajes de rocha que foram postas a descoberto pelas águas.
Passámos alguns túmulos de nómadas construídos de pedra solta, únicos vestígios da sua existência milenar nesta região.
Atravessámos uma zona incrível que parecia uma imensa “floresta” de enormes monólitos desmoronados que se elevam acima de uma areia fina de cor laranja, criando a sensação de percorrermos as ruínas de uma cidade perdida!
A paisagem é muito insólita e cativante por que a todo o momento julgamos reconhecer formas de edificações. Ao longe estende-se um mar de elevadas dunas que se tornam alaranjadas no fim do dia.
O espectáculo à noite, com a luz da lua, é quase irreal e muito belo.
Dormimos sempre sob as estrelas após um jantar à fogueira. Tínhamos bastante tempo para conversar e os guias touaregues falaram da sua cultura.
Os Touaregues
O chá é uma instituição indissociável do seu quotidiano. Logo no primeiro dia à chegada a Tripoli notei que na preparação do chá se concentravam sobretudo em criar uma espuma farta sobre a bebida. O chá no norte de África é preparado com uma quantidade exagerada de açúcar que, vertido de certa altura, produz espuma à superfície. Toda a sua preparação obedece a um ritual rigoroso, e percebe-se que os gestos são automáticos por terem sido repetidos vezes sem conta.
A abundante espuma é sinal de hospitalidade e de amizade. Um chá servido com pouca espuma é encarado como uma grosseria. O Hassan diz que se lhe servirem um chá com pouca espuma verte-o na areia, por que é uma afronta.
Ria-se e chamava-lhe “le champagne du désert”.
Os touaregues têm um ditado que diz que “o primeiro chá tem de ser forte como a guerra, o segundo doce como o amor, e o terceiro brando como o espírito”.
Ele contava que, ao contrário da sociedade islâmica, na sociedade touaregue é o homem quem tapa a cara. O homem tem vergonha de a mostrar, e nem aos filhos o faz.
Come virado para o pano da tenda, de costas viradas para os demais, e só à noite poderá a sua mulher conseguir enxergar a sua fisionomia.
Hoje este costume já não se aplica com rigor, mas os mais velhos ainda o cumprem na presença de estranhos.
Perguntei como se reconhecem as pessoas. Diz-me que é através da estatura e das mãos e dos pés! Sem o conjunto da face, os olhos deixam de ser relevantes, além de que muitos usam óculos com armações espessas de massa. Disse-me que conhece um ancião em Al Awinat que até hoje nunca alguém lhe viu a cara!
Nesta sociedade a mulher é relativamente livre e tem capacidade de escolha do seu noivo. Poderá conhecê-lo no poço ou nas pastagens, e tem liberdade para conversar com ele. No entanto, tem de casar virgem se não o noivo anula o casamento, e a família da noiva tem de indemnizar o seu pai dos gastos do casamento e devolver todo o gado que recebeu como presente.
Os touaregues, um povo tradicionalmente nómada, habita o núcleo central do Sahara ao longo das fronteiras comuns dos Niger, Líbia, Mali e Argélia. Formam uma comunidade com estreitas afinidade e solidariedade que remonta ao tempo em que a organização política era simplesmente tribal. Possuem uma língua e uma escrita comuns, o tamasheq, e têm liberdade para cruzar fronteiras sem restrições tal como viajavam outrora, sempre em busca de melhores pastagens.
Outrora, a sociedade touaregue compunha-se de nobres, homens livres, artesãos e escravos.
Os homens livres tinham os seus rebanhos e detinham património onde se contavam os escravos. Os artesãos trabalhavam o metal e a madeira, e as suas mulheres o couro e os tecidos. Esta classe vivia dependente da família de um homem livre, tal como antigamente os servos da gleba na Europa, mas recebia uma remuneração e gozava tempo de lazer, ao invés do escravo.
O pão touaregue é amassado sem fermento, ao contrário do que já provei noutras paragens do norte de África. A sua preparação é insólita: faz-se uma cova na areia que se enche de brasas, depois de a areia estar bastante quente, retiram-se as brasas e coloca-se a massa que se cobre com areia, e recolocam-se as brasas sobre esta areia. Ao fim de vários minutos o pão está pronto e escova-se a areia!
As tâmaras estão sempre presentes pois são o fruto tradicional dos touaregues. Têm muitas calorias e conservam-se longamente.
Ghat
Ghat foi uma antiga cidade-oásis com grande importância para o comércio caravaneiro, e uma das raras urbes onde se estabeleceram e se sedentarizaram famílias de touaregues. Situa-se na fronteira com a Argélia, defronte de Djanet, num cenário admirável com um mar de enormes dunas a sudeste, ao longe para leste o maciço de Akakus, e mais ao longe para oeste os montes Tassili n’Ajer na Argélia. Foi uma cidade parceira de Ghadamés como entreposto na rota das caravanas.
Visitei o mercado ao ar livre onde expõem comerciantes vindos dos vizinhos Niger e Argélia tal como há séculos. No entanto, o tipo de produtos e de bancas não diferem muito dos das nossas feiras de aldeia. Claro que não faltava a banca de cd’s piratas debitando som com grande estrondo.
Fiquei estupefacto com a estatura dos negros desta região, homens e mulheres, altos, espadaúdos e elegantes. “São descendentes de antigos escravos”, explica-me o Hassan com simplicidade.
Os artefactos típicos desta região do Sahara são os tapetes touaregues kilims, jóias em prata a destacar os colares e brincos que incluem âmbar, coral, conchas, e os punhais cerimoniais, roupa tradicional, cerâmica, artigos diversos em couro de dromedário, uma multiplicidade de artefactos usados e algumas interessantes antiguidades.
No estilo de Ghadamés, Ghat também tem uma cidade antiga, construída de adobe e com arquitectura de fortificação. Fundada no séc I aC, é um labirinto de vielas cujo urbanismo actual data do séc XII. A sua mesquita foi construída no séc X e tem uma arquitectura africana característica do Sudão. No centro eleva-se um terraço de onde se vigiavam os acessos à cidade, também o local onde se reuniam os notáveis e de onde se dirigiam ao povo.
Dominando-a do alto de um promontório situa-se o estreito e pequeno forte otomano, depois italiano. Daqui avistamos o verdejante palmeiral com as suas hortas e os bairros modernos. Dentro da cidade encontram-se algumas lojas de artigos tradicionais e de velharias.
Maciço de Akakus
É conhecido pelos seus enormes promontórios negros que se elevam acima da areia do deserto e pelas inúmeras gravuras e pinturas rupestres. Passámos um dia circulando nos grandes espaços entre rochedos, subindo e descendo dunas, em busca desta arte rupestre protegida pela Unesco e classificada Património Mundial.
As pinturas situam-se em cavernas e concavidades da rocha que os raios solares nunca atingem. Vi pinturas ainda coloridas, nomeadamente de encarnado, com figuras humanas, uma das quais chama-se “O Casamento” por estarem um homem e uma mulher juntos com as mãos tocando-se.
É interessante reparar nos detalhes das cenas de há cerca de 12000 anos quando esta região era arborizada e fértil. Vi gravados na rocha vacas, girafas, elefantes, dromedários, leopardos, cabras bem como cenas de caça e de guerra, e caracteres tuaregues.
Leptis Magna
Situa-se a 120 km de Tripoli e foi fundada pelos fenícios no séc VII aC. Foi conquistada pelos romanos no séc II aC e viria a tornar-se na maior e mais rica cidade romana em África, o seu porto um dos mais movimentados do Mediterrâneo sul.
Aqui se embarcavam animais exóticos, produtos agrícolas (trigo, azeite), peixe seco e a multiplicidade de mercadorias que chegavam nas caravanas que atravessavam o deserto, na rota que passava em Ghat e em Ghadames.
Esses tempos de esplendor estão reflectidos na monumentalidade da cidade onde se notam alguns excessos. Achei incrível a quantidade incalculável de arte que esta cidade encerra! Claro que só pude apreciar escultura e cantaria, mas a qualidade e a quantidade das obras são excepcionais. Aliás, falta conhecer o que ainda está soterrado. A autoria da maioria dos restauros é italiana e pareceram-me adequados, aliás esta arte é originária do seu país.
Admirei o grande arco de Septimus Severus, quadrangular com quatro passagens, revestido a mármore e muito esculpido, que marca o início da longa avenida ladeada de colunas que conduz ao porto.
Nesse caminho passamos pelos imponentes banhos de Adriano construídos em mármore. São dotados de grandes salões e piscinas, e no exterior abre-se um campo para desporto.
Muito próximo situa-se a basílica, um edifício de paredes maciças e intactas com uma envergadura imponente de 90m de comprido, repleto de obras de cantaria em calcário e em mármore que jazem no solo. Apreciei os mármores rendilhados com figuras humanas, vegetais e animais, um trabalho delicado que consegue chegar até nós praticamente intacto!
Do lado sul, situa-se o forum de Severo, um largo terreiro lajeado a mármore e cercado de colunas e de inúmeras estátuas. Noutra avenida que parte do arco, a avenida triunfal, passamos pelos arcos de Trajano e de Tibério para chegarmos ao mercado e ao chalcidicum que contém um templo e, mais adiante deparamos com o portão bizantino.
No mercado conservam-se as bancas de peixe com as medidas de comprimento ainda gravadas na pedra! Os poços e os chafarizes têm os bordos muito sulcados pelas cordas e pelos fundos das ânforas.
Vi as casas de banho públicas com longas lajes dotadas de orifícios em linha, sem separações ou resguardos, obrigando as pessoas a sentaram-se lado a lado, dando a ideia de que as discussões do forum se prolongavam neste recinto.
Muito perto eleva-se o teatro com as suas bancadas de calcário para 5000 pessoas e a maioria das colunas ainda erectas.
Passeando à beira mar deparamos com obras de cantaria e colunas dentro de água, cobertas de limos!
No regresso a Tripoli ainda houve tempo para deambular no souk, o centro comercial tradicional semi-coberto, e para nos sentarmos na esplanada de um café egípcio e puxarmos umas fumaças de um narguilé.
Nota sobre Segurança
Nos tempos que correm não soa muito bem passar férias na Líbia! Por que decidi então apostar neste destino?
Achei que o País gozaria de uma boa dose de exclusividade por ainda não ser muito procurado. Desde meados dos anos 80 que o País viveu isolado da comunidade internacional e vigorou um embargo imposto pela ONU até 2006. Neste momento a Líbia está com um desejo enorme de abrir-se ao exterior em todos os campos, incluindo o turismo. Viajar na Líbia é uma experiência idêntica à de viajar-se em Marrocos ou no Egipto, mas com muito menos viajantes!
O País é mais conservador do que estes, vêem-se menos mulheres vestidas à ocidental e quase todas com os cabelos cobertos, mas também vi muitas mulheres conduzindo, até motas. O álcool é proibido e possuí-lo é crime. Não há bares em Tripoli e a vida nocturna, após o fecho dos cafés, resume-se a circular a pé ou de carro em algumas avenidas exibindo as “máquinas” e os seus ocupantes. Em cada viatura são normalmente do mesmo sexo, excepto quando são casais (na mesma noite passei por dois Porsche Cayenne!).
Abundam os cartazes de grandes dimensões com o busto de Kaddhafi e o anúncio dos seus 38 anos de chefia do País. Não discuti política com os líbios pois achei o tema sensível, mas fiz perguntas e tentei perceber o que é o regime de escolha popular inventado por Kaddhafi.
No aeroporto de Sebha havia inscrições propagandísticas, uma delas dizia “o regime popular de escolha directa aborta a democracia”.
Achei a Líbia tão ou mais segura do que Marrocos e desconfio que a polícia exerce maior controlo sobre a população. No decurso dos cerca de 2000 km que percorri no País passámos dezenas de postos de controlo onde o nosso motorista tinha de entregar um documento. É uma autorização para empreender a viagem naquele itinerário da qual o guia tirava fotocópias regularmente… Contudo nunca vi um polícia verificar a matrícula das nossas viaturas!
Senti que o regime desconfia dos estrangeiros tomando-os por potenciais espiões. Os hotéis só me devolveram o passaporte quando os abandonei.
Uma medida inofensiva que a polícia exige foi a de ter de entregar o passaporte a um funcionário da nossa agência local para que o apresentasse no posto de polícia mais próximo no oitavo dia de viagem para verificar o visto.
O responsável desta agência informou-me que eles são responsáveis pela nossa “segurança” em todos os momentos em que permanecemos na Líbia.
Achei Tripoli uma cidade muito pacata e, comparada com Marrakech ou o Cairo, uma aldeia!
PS: Visite o site Rotas do Vento onde encontrará o programa de viagem na Libia com este itinerário "Viajando com os Tuaregues no Sahara".
28.05.07
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Monday, April 02, 2007
Micro-finanças
Ontem li um artigo no Herald Tribune que me deixou muito positivamente surpreendido.
Trata-se da existência de uma organização, Kiva.org, com base em São Francisco que constituíu uma rede de relacionamento com dezenas de pequenas organizações locais de auxílio com o propósito de emprestar dinheiro para pequenos negócios.
Em 2006 o Prémio Nobel da Paz foi atribuído a Muhammad Yunus junto com o banco Grameen de que foi fundador. O seu mérito é ter criado e desenvolvido durante mais de 30 anos a actividade de micro-crédito.
Ela consiste em emprestar pequenas somas de dinheiro a pessoas que nunca conseguiriam obter um empréstimo bancário por não terem garantias a prestar e por que nos seus países os bancos praticam usura.
Ajuda realmente todos os que têm capacidade de iniciativa e que são pessoas válidas com potencial para desenvolver um negócio, criar riqueza e empregar outras pessoas.
Acresce que nas sociedades subdesenvolvidas as mulheres são marginalizadas de forma crónica. Contudo, através desta rede elas são avaliadas com objectividade, o mérito do seu projecto, e tornaram-se em maioria na obtenção de empréstimos.
O genial da ideia é que os milhões de euros de ajuda externa desbaratados através dos canais governamentais corruptos e burocráticos, poderá passar a chegar intacto a quem mais precisa e a quem tem vontade e capacidade para trabalhar.
O sistema kiva.org é muito interessante pois cada pessoa pode enviar uma ajuda tão pequena quanto USD 25. O seu site na internet é claro pois identifica as pessoas necessitadas, o negócio a que se propõem e quanto lhes falta para completar o investimento.
Sempre suspeitei de ONG's desconhecidas e até de algumas conhecidas, mas o autor do artigo no Herald Tribune, Nicholas Kristof, relata como viajou no Paquistão e foi visitar dois comerciantes a quem emprestou dinheiro através de Kiva: um electricista com loja de reparações e um padeiro com forno a lenha. O relato é engraçado e convincente, e demonstra que esta organização é eficaz.
Clique na imagem para visitar kiva.org e contribua para minorar a pobreza no Mundo!
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